As crianças não brincam de brincar. Brincam de verdade... Por isso Nunca se deve tirar o brinquedo de uma criança, tenha ela oito ou oitenta anos. Mario Quintana


sábado, 26 de novembro de 2011

Elogio da Loucura

Numa dessas ricas conversas entre professores e alunos das quais os corredores da UFRN são testemunhas oculares, ouvi de um professor uma resenha do livro Elogio da Loucura, cuja autoria é do Erasmo de Rotterdam. Naquele momento, percebi meus ouvidos enviando suas famintas ordens para minhas glândulas salivares e, inexplicavelmente, comecei a salivar como se estivesse escutando o cheiro do feijão que só mamãe sebe preparar. Para satisfazer aquela fome desgraçada que me acometeu, convidei minha digníssima esposa a ir comigo no restaurante que vende livros (leia-se: livraria Siciliano do Natal Shopping) e pedi aquele prato que foi cozido no forno da loucura (leia-se: o livro Elogio da Loucura). Desde então venho padecendo na sua eterna digestão.

Erasmo faz na obra Elogio da Loucura fortes críticas as atitudes do homem e o acusa de utilizar a Loucura para a tomada de suas decisões. O autor considera que todos os atos humanos são desencadeados pela Loucura.
No discurso XIII, a Loucura - que durante todo o livro se apresenta em primeira pessoa, defendendo sua figura e seu ponto de vista - nos presenteia com o belíssimo argumento abaixo:
           E para começar, quem não sabe que a primeira idade do homem é para todos, de longe, a mais alegre e agradável? Mas o que tem as crianças que nos faz beijá-las, abraçá-las, acariciá-las tanto, que até os inimigos lhes vêm em auxílio? O que senão a graça que vem da falta de juízo, aquela graça que a prudente natureza se empenha em infundir nos recém-nascidos para que, por uma espécie de compensação agradável, possam amenizar as fadigas de quem os educa e conquistar a simpatia de quem deve protegê-los? E da adolescência que se segue à infância, como agrada a todos, que entusiasmo sincero provoca, que atenções carinhosas recebe, com que bondade todos lhe estendem a mão! Mas de onde vem, por favor, essa benevolência para com a juventude? De onde, senão de mim? É por mérito meu que os jovens são tão carentes de juízo; por isso estão sempre de bom humor. Eu mentiria, porém se não admitisse que tão logo crescem um pouco e começam a adquirir certa maturidade com a experiência e a educação, a beleza logo murcha, diminui a alegria, esmorece a graça, decresce o vigor. Quanto mais se distanciam de mim, menos vivem (...) p. 25.
 
           Em outro momento ela, a deusa Loucura, nos brinda com o seguinte:

           Em suma, sem mim nenhuma sociedade, nenhum relacionamento feliz poderia durar. O povo cansar-se-ia do príncipe; a serva, da patroa; o professor, do aluno; o amigo, do amigo; a mulher, do marido (...) se de vez em quando não se enganassem uns aos outros, ora adulando-se, ora sabiamente fingindo não ver, ora bajulando-se com o mel da loucura. (...) p. 35.
Nos trechos citados, percebemos o quanto o autor foi terno e abusado em suas palavras. Por isso, por causa de sua maneira peculiar e atrevida de expor seus argumentos, ele conseguiu prender meu inconsciente nas suas palavras. Elogio da Loucura é uma obra prima que propõe enriquecer nosso repertório de idéias “loucas”.

Concluo tendo a certeza que para um indivíduo (eu) se inscrever, influenciado por outro, num vestibular para Pedagogia, ter a sorte de conseguir ser aprovado no certame, querer concluir o curso e dizer que possui coragem de mergulhar no mar de torturas dos pedagogos formados pela UFRN, precisa ser, no mínimo, “louco” com L maiúsculo. “Louco” não, muito “Louco”. Pobre alma.


Por Rodrigo Barros

Referência: ROTTERDAM, Erasmo de. Elogio da Loucura. Tradução de Paulo Sergio Brandão. São Paulo: Martin Claret, 2008.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Another Brick in The Wall (Traduzido)



     A música Another Brick in The Wall (Um Outro Tijolo na Parede) da banda Pink Floyd é uma forte crítica a postura adotada por alguns professores em sala de aula e questiona o papel da escola na educação do indivíduo. Traz consigo um sentimento pretenciosamente provocante ao nos mostrar que tipo de educação escolar devemos combater e o quanto o ensino tradicional contribui para sermos apenas "um outro tijolo na sociedade."

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Por que educar?

     Por que educar?
     Por que o ser humano precisa se educar?
     Nota-se que essa segunda forma, aparentemente inocente, de fazer a pergunta já sugere a direção em que a resposta deve ser buscada.
     Poderíamos ter perguntado: Por que o ser humano precisa ser educado? Essa forma de fazer a pergunta de certo modo já aponta para uma resposta que pressupõe que o ser humano é objeto de uma ação educativa de terceiros.
     A formulação anterior, "por que o ser humano precisa se educar", por outro lado, sugere que ele possa - e deva - se educar a si próprio... Essas questões são complicadas. Aqui vamos procurar concentrar nossa atenção nesta questão "por que educar?" sem definir com mais rigor se um ser humano é educado por outros seres humanos ou se ele se educa a si próprio - ou, possivelmente, se acontece uma mistura dessas duas coisas à medida que a sua educação evolui.
     A discussão do "por que" do educar vai, posteriormente, nos levar à discussão do "para que" do educar, porque essas duas questões são, como se verá, estreitamente ligadas. 
     Então: por que educar?
     Nós, os seres humanos, e todos os demais seres, animados ou inanimados, temos uma natureza própria. É difícil definir com precisão qual é a natureza humana (tendo havido até os que negam que ela exista...). Mas há certos elementos básicos dos quais é difícil fugir. O ser humano (envolvendo, naturalmente, o macho e a fêmea da espécie) é, sem dúvida, um animal. Como os outros animais, ele se alimenta, se defende de ambientes hostis (incluindo a própria natureza física, outros animais, e até mesmo outros seres humanos), cresce, se reproduz, e morre. 
    O ser humano, porém, é diferente dos outros animais, que já nascem com vários instintos que lhes facilitam viver e lhes permitem sobreviver - ou, pelo menos, que os ajudam a sobreviver. Boa parte dos outros animais é capaz de se locomover com certa autonomia quase que desde o momento do nascimento. Muitos aprendem a se alimentar e a se defender bastante cedo e se tornam adultos e autônomos (até mesmo para se reproduzir) com razoável rapidez (em relação à duração total de sua vida). O ser humano, não. O bebê humano é um incapaz perfeito. Se desassistido, morre em pouco tempo. Leva quase um ano para conseguir andar precariamente, mais de dois anos para se comunicar minimamente com seus semelhantes, de cinco a dez anos para se tornar relativamente autônomo na busca de alimento, de doze a quinze anos para conseguir se reproduzir. Além disso, não é extremamente veloz, não enxerga nem ouve tão bem quanto alguns outros animais, não tem muita força, não tem dentes caninos poderosos nem garras ameaçadoras que possam ajudá-lo no combate com outros animais.
     Os outros animais desenvolvem essas características de forma instintiva, basicamente natural, sem muito esforço de sua parte. Basta, em grande medida, deixar passar o tempo que eles se tornam aquilo que está geneticamente programado que eles devem ser. Mesmo que seja possível interferir nesse desenvolvimento, como, por exemplo, acontece quando domesticamos certos animais selvagens, isso se faz através da ação de uma outra espécie (no caso, os seres humanos), não através da ação dos membros da mesma espécie. Um casal de leões não consegue domesticar seus leõezinhos para que eles se tornem menos ferozes... nem um casal de esquilos consegue tornar os seus filhotes ferozes para que possam sobreviver melhor...
     O ser humano não tem nada disso. Ele nasce, como se disse, um perfeito incapaz. Mas ele tem um potencial muito maior do que o dos demais animais - tanto que, ao longo de sua evolução, veio a dominá-los, embora eles, em geral, sejam mais fortes, mais rápidos, mais ferozes do que ele...
     Isso se dá porque, felizmente (para nós), o ser humano tem uma ferramenta de sobrevivência que os demais animais não têm: sua razão (que o torna um animal especial). Assim, o homem não é um mero animal: é um animal racional, que possui, como ferramenta de sobrevivência, sua capacidade de perceber o mundo de uma forma sui generis, construindo conceitos e emitindo juízos, imaginando estados de coisas que não existem, criando valores e agindo para transformá-los em realidade.
     É essa natureza humana que torna possível que o ser humano seja capaz de olhar ao seu rodar, perceber a realidade que o cerca, mas não se contentar com ela. Mas a natureza do ser humano não o obriga a viver em descontentamento: ela lhe permite tomar a decisão de transformar a realidade que não o satisfaz. Para transformá-la, ele tem, primeiro, que imaginar uma realidade diferente, que ainda não existe, para, em seguida, se perguntar, "Por que não?", e, daí, começar a construí-la. Ao concluir que determinada realidade não o satisfaz, o ser humano está atribuindo valores - em alguns casos a objetos e estados concretos, que existem ao seu redor, em outros casos a objetos e estados de coisas (ainda) inexistentes, em outros casos a idéias, ideais e valores, pelos quais ele muitas vezes se dispõe a arriscar sua vida, isto é, seu bem mais precioso...
     É parte da natureza do ser humano a sua capacidade de sonhar, de se propor objetivos e metas, de se apaixonar por seus sonhos, de construir planos para transformar esses sonhos em realidade e para alcançar seus objetivos e metas, de agir na execução dos seus planos, de revisá-los e ajustá-los, quando necessário, de persistir na busca dos seus sonhos mesmo na face da maior adversidade, de pensar a longo prazo, de se preocupar com o que a posteridade vai pensar dele depois de ele morrer...
     Infelizmente essa ferramenta de sobrevivência do ser humano não funciona automaticamente como funciona o instinto de sobrevivência dos animais. Ela só funciona se o ser humano, por um ato de vontade, desejar que ela funcione, decidir que vai usá-la e se preocupar em aprimorá-la e aperfeiçoá-la. E isso o ser humano só consegue fazer a partir do momento em que alcança uma certa maturidade - algo que começa a acontecer quando ele chega na adolescência - e não termina nunca mais... O momento do "estalo" (como o estalo de Vieira) se dá quando o ser humano percebe que sua vida não é geneticamente programada para ele, como a dos animais, e que, para sobreviver, ele tem que construir a sua própria existência, em liberdade. A construção de sua própria vida é o maior projeto que um ser humano tem diante de si. Nisso somos iguais.
     Mas somos drasticamente diferentes um dos outros nos projetos de vida que elaboramos para nós mesmos. Por isso a liberdade é essencial: para nos permitir construir projetos de vida drasticamente distintos. É nesse momento que o ser humano percebe que, para construir a sua vida, ele tem que conhecer uma série de coisas: a realidade natural que o cerca, a sociedade em que vive, e, naturalmente, ele próprio. Nesse processo, ele vai descobrir que algumas coisas contribuem para que ele viva a vida que deseja viver (com que sonhou), outras conspiram contra ela, outras são indiferentes. E ele vai aprender a conscientemente atribuir valor a tudo que o ajuda a viver a vida que ele escolheu viver, combater o que conspira contra seus planos, e, provavelmente, ignorar o restante. Nesse processo o ser humano vai desenvolvendo sua moralidade. Ele vai aprendendo que o moralmente certo é aquilo que o ajuda a viver a sua vida como ser racional, livre, autônomo, responsável, solidário - e o imoral é aquilo que o impede de alcançar a plenitude daquilo que ele concebe como o ser humano. 
     A adolescência é, em geral, um período de conflitos porque, nos anos que a antecedem, outras pessoas, em geral os pais, sonham com o que seus filhos serão um dia, constroem projetos de vida para eles... E esses sonhos e projetos podem não corresponder exatamente aos sonhos e projetos que eles têm para si próprios... Às vezes as divergências não são tão grandes quanto ao objeto dos sonhos e projetos, mas, sim, quanto à forma, ou ao momento, de transformá-los em realidade...
     Por que educar?
     O ser humano se educa porque ele, embora tenha um potencial enorme ao nascer, pode, por uma série de fatores, não vir a desenvolver todo o seu potencial. Para que ocorra, o desenvolvimento do seu pleno potencial humano precisa ser visto como o principal projeto de sua vida - e ser visto assim não só pelo ser humano, individualmente, mas por aqueles que o cercam: a família, a comunidade, e, a partir de um determinado momento, a escola, e até mesmo a sociedade, como um todo, em que ele vive.
     A educação do ser humano começa quando ele nasce - e termina apenas quando ele morre. A educação é o processo mediante o qual o ser humano se capacita para viver - para viver seus sonhos, para viver seus projetos, para viver, enfim, a vida que escolheu para si próprio. 


Autor: Eduardo O C Chaves

Trabalho Infantil

     Trabalho infantil gera lucro pra quem explora, pobreza pra quem é explorado, faz parte da cultura econômica brasileira e está diretamente ligado ao trabalho escravo. A quem incomoda a luta contra o trabalho infantil? Incomoda aos que se incomodam com a luta contra o trabalho escravo. Incomoda aos que se incomodam com a luta contra o trabalho degradante. O combate ao trabalho infantil incomoda a quem lucra com o trabalho infantil, a quem lucra com o trabalho escravo e a quem lucra com o trabalho degradante.
     A quem incomoda a dignidade humana? A quem incomoda a beleza, a resistência, a sensualidade, a honestidade, a capacidade de organização do pobre? A quem incomoda a imagem bonita dos menos favorecidos? A quem incomoda a denúncia das injustiças da pobreza? Incomoda aos ricos e incomoda a uma parcela da classe média. Pra existir um rico quantos pobres tem que existir? Me perguntou um dia um carvoeiro, cansado de trabalhar, desde criança.
     Ataliba dos Santos estava cansado de não assinar a carteira, não estudar, cansado de nãos... E cansado de não ter respostas. Enquanto fotografava pensava a quem interessa o desequilíbrio social? No Brasil, o trabalho infantil não é conseqüência da pobreza, mas sim instrumento financiador dela. Empregar crianças significa lucro fácil. A exploração infantil gera o desemprego dos pais, trabalho escravo, crianças doentes, subnutridas, morando em precárias condições, prejudicadas na sua capacidade intelectual e no seu direito à educação, lesadas no seu direito ao lazer, ao carinho, à alegria; sem infância.
     “A gente custa muito pra entender que nasceu pra ser peixe de engordar gato que engorda rico e, em casa, a gente fabrica com todo amor os próximos peixinhos. Pra fugir disso, botei todo mundo pra estudar, mas sinto um aperto no peito porque sei que o ensino é muito ruim. Filho de pobre, mesmo depois de estudar um, dois, quatro anos, continua analfabeto. “As palavras de José dos Santos, carvoeiro na região do serrado, em minas Gerais expressam a luta para mudar uma realidade.
     José dos Santos está tentando romper uma corrente perversa que alimenta uma cadeia de trabalho degradante nas carvoarias brasileiras, assim como nos sisais, nas fazendas, nos canaviais, nas pedreiras e em vários setores do segmento rural que alimentam indústrias urbanas. O trabalhador que vive em trabalho degradante ou análogo a escravo, é, na sua imensa maioria, analfabeto, e foi explorado como trabalhador infantil. Aconteceu assim com seus pais e seus avós. O caminho normal é acontecer com os filhos e netos.
     Infelizmente, ainda não existe no Brasil uma política social que faça a associação entre trabalho infantil e trabalho degradante, análogo a escravo ou escravo, de forma a romper esse círculo. A realidade é que o trabalhador escravo de hoje foi o trabalhador infantil de ontem. A realidade do trabalho nas carvoarias brasileiras merece uma análise diferenciada. Muitas vezes o trabalho não é considerado trabalho escravo, outras vezes sim. Porém, sempre é um trabalho extremamente pesado e quase sempre, mesmo em casos de carteira assinada, um trabalho degradante. Acaba com a saúde do trabalhador. Muitas vezes, olhar uma carvoaria em pleno vapor é, do ponto de vista humanitário, algo inaceitável.


Fonte: não lembro!!!