As crianças não brincam de brincar. Brincam de verdade... Por isso Nunca se deve tirar o brinquedo de uma criança, tenha ela oito ou oitenta anos. Mario Quintana


sábado, 7 de abril de 2012

O dia que fui brinquedo

O educador não deve se abaixar até a criança, mas elevar-se a ela e ao seu modo de ver e compreender  as coisas.

            Quando se trata da natureza infantil, aprendi que nela a fantasia é infinita: o que era lata vira carro, ser imaginário é melhor amigo.
            Estávamos na sala de estar. Eu e os Quatro Pequenos. Todos em cima de mim, literalmente. Vou tentar descrever.







            As Duas Menores me imobilizaram abraçando minhas pernas. Caí sentado no sofá. O Garotinho pegou meu braço e puxou contra seu corpo deitado. A Mais Velha, de oito anos, não perdeu tempo. Subiu logo nas almofadas, e começou uma difícil e divertida escalada na montanha de carne que ela entendeu ser as minhas costas. O cume era o meu cangote¹. Foi então que percebi que estava em apuros. Ora! Imagine, eram quatro, QUATRO grandes e persistentes guerreiros mirins superpoderosos contra um singelo adulto desarmado. Eu precisava reagir rápido, pois meu fim parecia bem próximo. Para não ser derrotado, incorporei um monstro forte e mal encarado que meu pai criara durante minha infância. Ele possuía enormes mãos fazedoras de cócegas. Comecei a revidar. A cada golpe que dava os risos e gargalhadas espirravam para todos os lados. Um a um, eles sucumbiram. Foi um verdadeiro e hilário massacre. A Mais Velha caída e sem forças, limpou os risos que ainda escorriam de sua boca e me falou: “Tio, você parece um brinquedo. A gente pula, monta, sobe, brinca em cima de você igualzinho a um parquinho. Faz de novo! Vai faz!”.
            Seria mais um fim de tarde igual a qualquer outro. Comum se não fosse o comentário dessa criança. Pode um adulto ser comparado a um brinquedo? Eu, um brinquedo? Como pode isso?
            A sabedoria infinita daquela garotinha me fez refletir sobre quem quero ser: um educador que entende que pode fazer diferença para alguém em algum lugar, em alguma ocasião. Basta apenas conseguir enxergar esses momentos.
          Agora sei que crianças são capazes de trocar qualquer brinquedo por alguns momentos de diversão com um Adulto Brinquedo. É como se as borboletas ignorassem o perfume e a beleza das flores para pousar nos ombros cativados de um homem...
          E com os beijos, abraços e brincadeiras dos meus pequenos vou vivendo. É assim que me renovo.

Nota¹: Parte posterior do pescoço.

2 comentários:

  1. É necessária a empatia ao ensinar, compreender o mundo através dos olhos do aluno. Perceber sua dor e amargura assim como sua alegria e força ao contemplar seu cotidiano e ponto de vista. A riqueza da criança ao fazer de uma caixa de papelão um multiverso e a simplicidade dela ao se permitir aprender constantemente são apenas dois dos maravilhosos princípios que cada uma dessas preciosas almas nos ensina ao nos permitirmos tal empatia. Perceber a sensibilidade do infante nos ensina sobre pureza, sobra a humilde submissão que protege mas questiona. Certamente é maravilhoso colocar nossos olhos ao mesmo nível dos de uma criança. Ainda mais agradável é ver um desses tesouros caminhar pela estrada da justiça e da bondade por meio do exemplo e das palavras dos seus educadores. Doces são suas brincadeiras e seus pensamentos, suas palavras são sinceras e cheias de amor. Toda criança carece de nosso afeto e cuidado e retribui com uma gratidão pouco encontrada entre adultos. Mais que aprender, ensina sem que o queira,sem que o planeje, sem que o saiba sequer.

    ResponderExcluir
  2. Gostaria de parabenizar pelo blog, super criativo e inteligente, encheu os meu olhos logo quando entrei na página e quando lí este texto sucumbi de vez ao seu charme, creio que de agora em diante será uma das páginas mais visitadas por mim, inspirador!

    ResponderExcluir